A lista de benefícios a que cada deputado estadual tem direito em Mato Grosso do Sul é invejável. Um deles, contudo, não consta da relação: auxílio-moradia. A falta de previsão de mais esse benefício, no entanto, não impediu que 3 dos 24 deputados estaduais morassem em Campo Grande, pagando aluguéis caríssimos, com dinheiro da Assembleia Legislativa.
O MS em Brasília apurou que Gleice Jane Barbosa (PT), Lia Nogueira (PSDB) e Neno Razuk (PL), todos de Dourados, utilizaram a Cota para Exercício da Atividade Parlamentar (CEAP) em 2023 para pagamento de aluguel residencial, o que não é permitido. Gastaram, juntos, R$ 124.468,28 em dinheiro público.
De acordo com o artigo 2º do Ato nº 52, de 01 de outubro de 2019, da Mesa Diretora da Assembleia, a cota extra poderá ser utilizada para custear diversas despesas, entre elas “manutenção de escritórios de apoio à atividade parlamentar”. Não há exceção.
Como se morar de graça fosse pouco, Lia e Gleice ainda têm escritórios em Dourados, com valores mensais de R$ 3.853,81 e R$ 2.562,62, respectivamente. Com isso, elas gastam, em média, R$ 10 mil cada por mês com dois imóveis.
Bom gosto
Em relação ao gosto de morar bem com aluguel pago pelos contribuintes, as deputadas se saem melhor que o deputado. A petista e a tucana escolheram apartamentos de alto padrão em Campo Grande e o deputado, médio.
Gleice Jane, que assinou o contrato de locação em maio de 2023, mora no suntuoso Green Life Residence, na região do Carandá Bosque, próxima ao Parques dos Poderes, apenas a 7 minutos do local de trabalho dela, a Assembleia.
Entre maio e dezembro do ano passado, a deputada pagou R$ 44.601,83 — média de R$ 5.575 mensais pelo aluguel. O tamanho dos apartamentos no residencial Green Life varia de 109 a 134 metros quadrados, com três ou quatro quartos. Já o valor para venda de R$ 1 milhão a R$ 1,7 milhão, segundo consultas feitas pelo site ao mercado de imóvel da Capital.
Já a tucana reside no charmoso Edifício Salvador Dali, no Jardim dos Estados, dos bairros mais caros e tradicionais de Campo Grande. Lia Nogueira utilizou R$ 46.533,98 da CEAP com aluguéis do imóvel, no período de fevereiro a novembro, média de R$ 6.653 mensais. Apartamentos com 132 metros quadrados, avaliados em R$ 1,4 milhão.
Menos exigente, em 2023, Razuk morou em dois apartamentos de padrão médio, conforme apurado. Começou na Rua 13 de Junho, região central, onde gastou R$ 24.996,51 da cota da Assembleia, entre janeiro e setembro.
De outubro a dezembro, o parlamentar douradense apresentou comprovantes de pagamento de outro imóvel, localizado no Bairro Tiradentes, no total de R$ 8.335,96. O valor do aluguel dos dois imóveis, somados, atingem R$ 33.332,47.
Problemão
Consultas feitas pelo MS em Brasília no Portal de Transparência da Assembleia, contudo, indicam que Neno Razuk utiliza a CEAP para pagamento de aluguel de imóvel residencial desde março de 2019. No entanto, os primeiros comprovantes de pagamentos com essa despesa só passaram a ser disponibilizados pela Casa a partir de abril de 2020.
Logo, de acordo com dados oficiais, o parlamentar usa a CEAP para esse fim de abril de 2020 a dezembro de 2023. Nesse período, foram feitos pagamentos de R$ 104.735,43 em aluguéis de apartamentos residenciais, o que é irregular.
Outro lado
O MS em Brasília encaminhou pedido de esclarecimento a cada deputado, no início da tarde de quarta-feira (10), tanto pelos e-mails informados no site da Assembleia Legislativa, quanto para os perfis dos parlamentares no Instagram, detalhando as situações de cada um.
Apenas a deputada Gleice Jane se manifestou, por meio de nota da assessoria de imprensa. Defendeu a legalidade dos pagamentos do aluguel, citando o Ato 52/2019, da Mesa Diretora:
“A fundamentação para o custeio do aluguel do imóvel residencial (Green Life) se encontra no artigo 2º, inciso V, do Ato da Mesa Diretora da Assembleia Legislativa do Mato Grosso do Sul de n.º 52/2019, uma vez que o domicílio eleitoral da parlamentar é em Dourados, onde segue sendo sua residência principal e onde mora sua família. Em Campo Grande, o imóvel é utilizado em média de 4 a 5 dias por semana, atrelado aos dias em que exerce suas atividades parlamentares”, justificou a parlamentar.
Em seguida, a reportagem encaminhou o ato citado por Gleice, com marcação do trecho em que é tratado sobre o aluguel de “imóvel para escritório de apoio ao parlamentar”. Contestou não haver qualquer menção a aluguel de imóvel para residência do parlamentar.
Questionada novamente, a assessoria completou a informação: “Embora tenhamos esse embasamento de hospedagem, esse apartamento também é um local muito utilizado para fins de trabalho, reunião com a equipe e eventual atendimento”.