Mais de um ano depois da criação do marco legal de saneamento, a gestão do lixo pouco avançou. Apenas nas cidades onde há a concessão da coleta e destinação do lixo houve algum avanço. Segundo o Sindicato Nacional das Empresas de Limpeza Urbana (Selurb), o lixo gerado por pessoa é menor nas cidades que cobram por serviços de coleta, tratamento e descarte de resíduos.
Em Mato Grosso do Sul, cerca de 80% das cidades (63 municípios) faz a destinação final do lixo de forma inadequada. Apesar do marco legal, que vem se renovando há mais de década, com novos prazos se estendendo, a Agência Nacional de Águas (ANA) reclama que os municípios precisam informar o cumprimento de metas. O Governo do Estado lançou em 2016 o Plano Estadual de Resíduos Sólidos, com metas para a gestão do lixo urbano. O Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul) gerencia o Plano, que estabelece nove programas compostos por 139 metas e ações. Foram definidos, também, os investimentos necessários para sua implementação, sendo que mais de 80% do total estão divididos nos três principais programas que visam o fortalecimento institucional, estruturação de equipe técnica estadual, revisão de inventários e implementação de um sistema de informações de gestão; gestão e gerenciamento dos resíduos sólidos; e ações de inclusão social e emancipação econômica dos catadores de materiais recicláveis.
Em fevereiro deste ano a AGEMS (Agência Estadual de Regulação de Serviços Públicos) passou a regular, fiscalizar e dar suporte aos municípios para o cumprimento de metas. A diretora de Saneamento Básico da AGEMS, Iara Marchioretto, considera fundamental para acelerar o cumprimento do marco legal a regulação da prestação e utilização dos serviços públicos de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos. De acordo com o secretário de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar, Jaime Verruck, a extinção de lixões e adoção de aterros sanitários consorciados entre os municípios, o funcionamento efetivo do Sistema Estadual de Logística Reversa de Embalagens, a mudança cultural de cada cidadão e empresa sobre a separação e o descarte correto do lixo são desafios que podem ser superados em dois anos, mas será preciso um “trabalho árduo”.
Cada família gera, em média, um quilo de lixo por dia. Em Campo Grande a maior parte vai para o aterro sanitário, mas uma boa parte ainda tem destinação inadequada. Para avançar na destinação correta, em Campo Grande a Solurb, empresa que faz a coleta, tratamento e descarte do lixo, aposta nas campanhas educativas e soluções criativas, como o uso sustentável dos resíduos. Há uma tendência de redução dos aterros, em razão da emissão de gases que provocam o aquecimento global. O Plano Estadual de Resíduos Sólidos estabelece cinco metas:
Compartilhamento das responsabilidades entre o poder público e a iniciativa privada (neste caso para a logística reversa), planejamento das ações para melhoria do sistema de resíduos sólidos, implantação de infraestrutura adequada (coleta seletiva e disposição final), educação ambiental e cobrança pela prestação dos serviços públicos.
Bruno Velloso, gerente Operacional da CG SOLURB Soluções Ambientais, concessionária responsável pela gestão da limpeza urbana na Capital e o manejo de resíduos sólidos do município, explica qual é o estágio da destinação do lixo urbano de Campo Grande. Confira a entrevista:
Pergunta – Quais são as formas de destinação final de resíduos sólidos mais utilizadas? Qual é a destinação correta para o lixo doméstico (resíduos domiciliares) e como esse descarte é feito em Campo Grande?
Bruno Velloso – Segundo o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS, 2019), dos locais de disposição final utilizados no Brasil, os lixões ainda representam 47,8% (1.114 unidades), os aterros controlados 24,9% (580 unidades), os aterros sanitários 26,6% (621 unidades) e as unidades de tratamento por incineração 0,7% (17 unidades). Dos citados, apenas os aterros sanitários e as unidades de tratamento por incineração são consideradas técnicas ambientalmente adequadas. Dito isso, o aterro sanitário se configura como o método mais utilizado no Brasil dentre aqueles que respeitam as legislações e normativas vigentes.
A destinação correta do lixo doméstico deve ser feita de modo a não contaminar o meio ambiente e tão pouco acarretar danos à saúde humana. Em Campo Grande a disposição final é feita no aterro sanitário Dom Antônio Barbosa II, devidamente licenciado, possuindo impermeabilização do terreno, drenagem e tratamento de percolados, captação e tratamento de gases e outras técnicas de controle.
P – Há uma classificação dos resíduos? Como é feita a separação do lixo reciclável? Há alguma cooperação entre a Solurb e catadores para a coleta seletiva. Para onde vai o lixo reciclável coletado pela empresa? O lixo reciclável é destinado a alguma cooperativa de usinagem e reaproveitamento?
Bruno Velloso – Existem diversas formas de classificação dos resíduos, as quais podem se basear na sua origem, na sua periculosidade, nas suas características físicas ou químicas e no seu risco. Para a população em geral, a forma de classificação mais conhecida é referente a sua característica física: resíduos secos (recicláveis) e resíduos úmidos (orgânicos e rejeitos).
A separação do lixo reciclável deve ser feita na fonte geradora (residências) e acondicionado separadamente dos orgânicos e rejeitos, respeitando os dias e horários do serviço de coleta seletiva, que podem ser consultados através https://www.solurb.eco.br/servico/coleta–seletiva/18
Todo lixo reciclável recolhido pelo serviço de coleta seletiva vai para UTR Municipal, onde são separados e vendidos por cooperativas/associações.
P – Que tipo de lixo tem coleta seletiva, além do papel e plástico, metais e vidros.
Bruno Velloso – Como o serviço depende diretamente da colaboração e engajamento da população na segregação adequada dos resíduos, acabam indo, além dos recicláveis, resíduos orgânicos, rejeitos e até perigosos para a UTR. Por isso, é de suma importância que a separação realizada pelos cooperados nas esteiras da usina seja feita com a utilização de EPIs.
Acessando https://www.solurb.eco.br/educacao–ambiental–ver/cartilhas–educativas/9é possível consultar uma gama de material educativo fornecido pela concessionária, onde pode ser observado os resíduos que são passiveis de reciclagem e devem ser disponibilizados para a coleta seletiva e aqueles que devem ser disponibilizados para a coleta convencional.
P – Os aterros sanitários ainda são utilizados na destinação do lixo doméstico e industrial?
Bruno Velloso – De acordo com o Plano Nacional de Resíduos Sólidos (2022), os aterros sanitários figuram como a principal forma de disposição final ambientalmente adequada no país.
P – O lixo pode ser processado para geração de energia? Como ele pode ser aproveitado para esse fim?
Bruno Velloso – Sim, principalmente através de unidades de tratamento por incineração. Entretanto é uma técnica ainda pouco utilizada no país, existe também a possibilidade de geração de energia através do reaproveitamento do biogás gerado nos aterros sanitários.
P – O que fazer com o lixo de componentes eletrônicos, como dispositivos móveis (telefones e tablets), carregadores, fiação, pilhas?
Bruno Velloso – Para o lixo de componentes eletrônicos, a C.G. SOLURB disponibiliza cinco locais que destinam adequadamente esses resíduos.
Já os resíduos de pilhas/baterias são enquadrados como resíduos de logística reversa obrigatória, isto é, devem ser aceitos e recolhidos pelo estabelecimento que os comercializou.
P – Como funcionam os ecopontos para a coleta de lixo eletrônico? A Solurb desenvolve algum tipo de campanha educativa orientando a população sobre essa necessidade?
Bruno Velloso – Os ecopontos funcionam como um empreendimento de entrega voluntária onde a população pode destinar até 1 m³/dia de lixo eletrônico e outros resíduos. A C.G. SOLURB desenvolve ações voltadas à divulgação dos ecopontos através das suas mídias sociais e campanhas de educação ambiental in loco, como visitas nas residências, palestras e demais eventos. Em 2021, as ações alcançaram mais de 185 mil pessoas apenas com as mídias digitais no 1º semestre e 285 mil pessoas no 2º.
P – Em algumas situações, assistimos também ao descarte de entulhos, móveis velhos e animais mortos em áreas públicas e terrenos baldios. Como a Solurb lida com esse problema?
Bruno Velloso – Da mesma forma que os ecopontos aceitam o descarte de componentes eletrônicos, essas estruturas estão aptas a receber entulhos, móveis inservíveis, materiais recicláveis e até resíduos de poda.
Em relação aos animais de pequeno porte mortos, a C.G. SOLURB disponibiliza o serviço de coleta e correta destinação para essas carcaças, em que a população pode fazer sua solicitação pelos canais de comunicação da empresa.
No entanto, a partir do momento que esses resíduos são destinados de forma irregular a concessionária não executa a coleta/ limpeza dos mesmos, sendo esse trabalho realizado pela a Prefeitura Municipal de Campo Grande ou o proprietário do terreno. Ressaltamos que o poder de fiscalização dessas demandas também fica a cargo da PMCG.
P – A Solurb desenvolve atividades de conscientização e educação ambiental em escolas públicas? Que benefícios são esperados com esse tipo de ação educativa?
Bruno Velloso – Sim. O intuito é ajudar a construir uma geração sensibilizada com as causas socioambientais e que saiba a importância do correto gerenciamento dos resíduos sólidos para a preservação do meio ambiente.
P – Quais as principais recomendações para a população colaborar e contribuir com a limpeza pública, principalmente de parques e áreas comuns?
Bruno Velloso – Principalmente evitar o descarte de lixo nos locais inadequados, como áreas de passeio, gramados, ruas, bocas de lobo, etc. Buscando sempre fazê-lo em lixeiras ou outros dispositivos apropriados.
P – Qual é o volume/quantidade de lixo produzido nos domicílios, empresas, indústria e setor público em Campo Grande?
Bruno Velloso – Em 2021, o aterro sanitário Dom Antônio Barbosa II recebeu um total 279.895,83 toneladas de resíduos sólidos. Isso resulta em aproximadamente 897 toneladas por dia útil de operação.
P – Qual a destinação do lixo hospitalar?
Bruno Velloso – Apenas as unidades públicas de saúde municipais são atendidas pela C.G. SOLURB e têm seus resíduos perigosos recolhidos e tratados através da incineração ou autoclavagem, conforme as particularidades do material coletado.
P – A destinação ambientalmente correta dos resíduos sólidos é de extrema importância para as empresas tanto devido às obrigações legais e exigências normativas, quanto para o mercado que exige um comprometimento mais sustentável das organizações. Mas como realizar a destinação certa? O que as empresas precisam fazer? Todos os negócios são obrigados a destinar os resíduos gerados segundo a lei?
Bruno Velloso– A Lei Complementar nº 209/2012 determina que os estabelecimentos comerciais, as indústrias, as instituições, órgãos e entidades públicas sejam atendidos pelo serviço público de coleta regular para os resíduos sólidos equiparados aos domiciliares. Contudo, a lei ainda estipula que, ultrapassadas as quantidades diárias máximas (200 L ou 50 kg), os resíduos passam a ser considerados como provenientes de grandes geradores, devendo ser recolhidos por intermédio de coleta especial.
Portanto, as empresas caracterizadas como grandes geradoras de resíduos sólidos devem proceder com a contratação particular de prestadores de serviços licenciados que realizam a coleta e destinação final desses materiais.
Além dos grandes geradores de resíduos comuns, qualquer empreendimento gerador de resíduos perigosos, independentemente da quantidade gerada, é responsável por arcar com o destino ambientalmente adequado daquele material.
P – De acordo com a Política Nacional de Resíduos Sólidos, a destinação de lixo diz respeito à reutilização, a reciclagem, a compostagem, a recuperação e o aproveitamento energético. Quais são as etapas definidas pela Política de Resíduos Sólidos que Campo Grande ainda não estabeleceu metas?
Bruno Velloso – Quanto à reutilização, reciclagem e recuperação de resíduos sólidos, a C.G. SOLURB atua fortemente com a disponibilização da coleta seletiva porta a porta, coleta seletiva através dos mais de 200 locais de entrega voluntária (LEVs), recebimento de resíduos nos 05 ecopontos, bem como com suas ações de educação ambiental. Ainda, mantém-se permanentemente acessível a novas tecnologias e técnicas de recuperação de resíduos, sempre priorizando procedimentos sustentáveis, ou seja, que respeitem os aspectos sociais, ambientais e econômicos.
P – A gestão de resíduos possui diversas etapas estabelecidas pela Política Nacional de Resíduos Sólidos, entre elas a redução da geração de resíduos, visando a não geração. É possível reduzir a geração de lixo? Não sendo possível, como lidar com a demanda pelo acondicionamento e depois a disposição final?
Bruno Velloso – Apesar de historicamente haver registro de aumentos da geração per capita ano após ano, com a diminuição do consumo, influenciado pela pandemia de Covid-19, naturalmente ocorreu também uma redução na quantidade de lixo gerado nos últimos dois anos. Mesmo assim, há otimismo quanto à uma manutenção dessa diminuição na geração em condições normais, visto que – cada vez mais – esse tem se tornado um tema comum e conhecido pela população em geral.
De qualquer forma, ações de educação ambiental que visem o maior engajamento das pessoas com a coleta seletiva e um empreendimento, devidamente licenciado, que atenda as projeções de demandas, é fundamental para garantir a preservação do meio ambiente e garantia de uma disposição adequada.